25 julho 2008

em 1984, no circo voador, alguém diz

agora é hora de enxugar as lágrimas e voltar pra sacanagem!, que é muito melhor


benzinho, eu ando pirado. rodando de bar em bar, jogando conversa fora, só pra te ver
passando, gingando, me encarando, me enchendo de esperança. me maltratando a visão


girando de mesa em mesa
sorrindo prá qualquer um
(filha da puta)
fazendo cara de fácil,
jogando duro com o coração

24 julho 2008



, dizendo que sabe que eu aceito com força a tudo que aparece: problemas que não pedi, ofertas de desafio, homens que não conheço. que, além de queimar minha alma com as retinas, quando ajo como uma desvairada, louca, tonta, é que me quer inteira e nua de razão, ali onde degolaram os ladrões nouta vez. nem ligo, dou risada, cuspo nos cabelos, mas me aquieto depois. bebo o que me oferece e engulo junto o choro, numa quina de paredes frias.

, que foi onde comecei, pouco a pouco, minha coleção de dias, transformados em palitinhos, finos como eu, mas assim também como eu, pontiagudos e afiados. por vezes, meu palitos cronológicos furavam até meus pensamentos, mas essa época passou, não volta mais, então eu respiro, pego outra parede, ponho-me a desenhar mais palitinhos (trapaceio, às vezes: desenho mais de um palitinho num mesmo dia, que é pra fazer o tempo correr mais depressa).

, aquela mesma, que vem sempre aí. pobrezinha, nem desconfia que depois do quarto é só pó, um travesseiro que quase contra a vontade guarda o cheiro azedo de um perfume sem nome, uma escova de cabelo de metal azul e um tapete. se fizer silêncio, escuto seus gritos. mesmo intensos, são leves, e a imagino assim, de maçãs rosadas e pés descalços, e finjo sentir o mesmo que ela sente, esse sentir que vem lento, e forte, e quando dou por mim estou deitada e pobre e a cabeça dói, e tento me recompor, olho em volta, ninguém viu, mas a vergonha não é dos outros, é de mim mesma, a única pessoa pra quem eu devo alguma coisa

, a não ser ele, que me dá de comer e de beber, é uma boa pessoa. quando fico triste porque penso que vou sangrar tudo que tem em mim, ele aparece, me manda perceber o quão sortuda sou por ter ele ali, comigo, pra me dar um teto e o que vestir; então agradeço, jogo-me aos seus pés e beijo com força de gente que é louca todas as partes do corpo que ele tem, e é quase sempre quando ele também põe-se louco à minha frente, mas como sou gorda e baixa, e ruiva, meu grito não é leve, é um grito grave, pesado, e acho que não gosta muito, porque logo sai, e torno a desenhar palitinhos na parede e enrolar os fiapos do tapete, até que o sol volte pela fresta da quina, a quina que é fria e dura, mas que é minha, minha como algum dia nessa vida ele vai ser meu, vai ser, sim

23 julho 2008

aliás


nunca estive tão cazuza



migalhas dormidas do teu pão
pequenas porções de ilusão
teu corpo com amor ou não
mentiras sinceras me interessam
faço promessas malucas
tão curtas quanto um sonho bom
se eu te escondo a verdade, baby
é pra te proteger da solidão
é que eu não amo ninguém
parece incrível
não amo ninguém
e é só amor que eu respiro

16 julho 2008

apelo de um saco que já encheu



a partir de hoje, não se conversa com niguém. a partir de hoje, se mede toda e qualquer ameaça de ação, de beijo no rosto, de abraço apertado. se reprime qualquer vontade de palavras carinhosas. o olhar dirigido a presenças masculinas está terminantemente proibido (não importando o nome, o endereço postal, a idade). não se pode rir, não se chora mais. a partir de hoje, as mãos só apertam as mãos íntimas, os olhos só conversam fechados, o corpo não encosta mais em ninguém. a partir de hoje, tudo é feito com equilíbrio, tudo é medido para caber nas conversas, não se usa mais perfume, não se passa mais a mão no cabelo. a partir de hoje, nenhuma conversa é feita a partir do mesmo nome, nenhuma vida existe dentro daquela vida, nenhuma vontade é realizada, tudo é deixado pra trás. o amanhã deve ter na bandeira as palavras: que se foda a intuição, o desejo, a sinceridade! que se encarnem em todos os robôs da rotina e que mandem embora o mais depressa possível o impulso terrível de se ser humano.

e que sejam amaldiçoados todos aqueles que, como eu, têm nas veias sangue vermelho e nos olhos o impulso de viver. que definhem todos os que têm fome, que morrem de vontade, os que secam de desejo, os que ardem. porque as veias fracas e os olhos pálidos daqueles que não vivem não suportam a visão da vontade; aprisionam-se entre bons costumes e descontam nas línguas as vontades do corpo que a mente não obedece. e amaldiçoado também seja aquele que disse que inútil dormir que a dor não passa; aquele que insistiu que a vida é feita de se agir duas vezes antes de se evocar o pensamento. aos outros, só peço que vão é esperar a vida passar na frente dos olhos, criaturas burras: assim, poderão falar dela também, ocupando muito mais a língua do que o coração atrofiado. se meu instinto não é bem visto aqui, devo mesmo é me aquietar e ir viver na luxúria e na agonia calma e quieta das mulheres de chico, de adriana e de vinicius, aqueles malditos promíscuos, indignos dos bons costumes de se viver junto aos 'normais'.



 

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