24 março 2009

você escapou, pequenino. quando acordei o sol já estava lá fora, é essa mania da vida de esfregar na nossa cara que o mundo não parou só porque é assim que nós sentimos, e não só ele não pára como cotinua a esperar de nós todas aquelas coisas que devemos ao conceito de civilização, os dentes bem escovados, a cama feita, a vestimenta apropriada, o dia nosso de cada dia que está lá sob sol ou chuva. hoje faz sol, mas um sol fraco e tímido, que teve de subir por uma convenção física, mas que entende muito bem que não é bem-vindo.

você escapou, pequenino. foram treze dias sem notícias, sonhei contigo no décimo quarto, se perguntarem não sei dizer quais os caminhos que nos levaram a uma cama barata na região metropolitana no décimo quinto. o curso natural das coisas desaprova, aquele mesmo curso que faz o sol levantar, mas desaprova pra mim apenas, você pareceu confortável e eu não quis interromper e então eu entendi que havia um pouco mais que isso, que ainda havia janeiro e fevereiro e março mesmo que pela metade, e março já está acabando, e com ele o quê.

você escapou, pequenino, mas você vai e volta, e diz coisas como que bom que continuamos juntos mesmo depois de tudo aquela, e eu vejo o sol cor-de-lis e quase sinto cheiro de lavanda e aquela brisa pacífica de viña del mar, mas bem sabemos, quase não é, quase não tem cheiro, quase não tem brisa, e então estar ao seu lado é como uma corda bamba, eu sei que as facadas virão mas nunca sei de onde e por isso não posso defender, e elas vêm, sempre vêm, e você diz se não fosse assim não teria graça, ora, às favas com a graça, a graça que se estrepe, eu não quero graça não. então você diz eu sou assim, me aceita, mas não vê que eu aceito, que já aceitei, que aceitei como nunca havia aceitado e que ainda não entendo como pude aceitar tudo aquilo que condeno desde o princípio, mas que nada é eterno, nem mesmo a aceitação, eu penso tudo isso e fico quieta porque sei que basta uma vírgula colocada no lugar errado pra tudo ir pelos ares, é assim que eu vivo, nesse cuidado louco.

você escapou, pequenino. bem sabe você como corri pelo caminho buscando essas tantas pequenas-chances que encontrei, e tanto eu corri que voltei a gostar mais de mim mesma e, por consequência, pensar racionalmente. seja mais egoísta, você diz como quem quer dizer pense mais em você e não em mim, porque bem sabemos, não adiantará nada. e eu olho e respiro porque não há o que dizer e então você diz que o 'amor' não é o mesmo e eu dôo, mas penso que deveria botar entre nós um espelho, virado pra ti, pra que pudesses olhar nos próprios olhos e ver como tudo parece patético e bobo e como a tua cara condena muito mais do que tu gostarias, às vezes os olhos dizem muito mais que a boca, quem sou eu pra convencer, mas se houvesse o espelho talvez você risse e dissesse tudo bem, tudo bem, mas lerei durante as tardes.

você escapou, pequenino. escrevo desacreditada porque se goethe não seduziu que dirá eu. herança do décimo sétimo fico amortecida, alguma coisa mudou porque há uma calma aqui dentro que eu não condeno mas que torço tanto pra que vá embora logo e volte o furacão de outros tempos. como já disse, desisti de todos os pequenos-jogos que conheço bem porque sei não fazer efeito contigo, pensei talvez melhor ser honesta uma vez na vida, não que tenha dado certo, mas considere a tentativa. o mundo anda girando de um jeito estranho e sob certa luz declarações mais parecem despedidas, adeus têm cheiro de até logo, quem vai saber, é como meu desejo agora de saber se haverão mais vinhos, mais sinucas baratas, se haverão mais risadas embaixo de árvores, pequenas-comidinhas, discussões ideológicas, se haverá alguma das cento e doze oportunidades de que precisamos pra fazer tudo aquilo que foi combinado, uma cachoeira, um jantar longo, um álbum de fotos, ninguém há de saber o futuro, me diriam, e eu responderia dizendo que ninguém há de controlar o que se quer.

você escapou, pequenino, e lembro ainda de tudo aquilo que teu corpo diz sem que você perceba, porque o corpo é o dono do impulso, não se escolhe as palavras, não se reprime uma vontade do corpo, ele é todo menos dócil que a língua, ele fala por si, e ai de você se ouvisse tudo o que ele me diz quando você me beija a testa, acarinha o joelho, procura por baixo da mesa meus dedos pra brincar, enche o pescoço com cinco ou seis pequenos beijos. cairias duro e surpreso se soubesse o que teus olhos vêm gritando toda vez, mesmo de longe. propus no décimo sexto que continue a me dar seu corpo, que entre você e ele, talvez ele goste mais de mim. me poupo sem saber dos pensamentos sobre tal convite, ele existe, tu aceitaste, está aí, e não o nego, é um convite racional, como tudo me parece ser agora, cru mas seco e sem expectativas, como tu querias e eu, humilde, acatei, bem sabendo que encaras tudo como se não se importasse, como se não fizesse diferença, é assim, ótimo, se não fosse, estaria bom também.

você escapou, pequenino. esperei por algo que não sabia o que era e que jamais saberei porque não é feito para chegar, aprendi a entender e agora calmo. nada muda desde o décimo sétimo, anestesiei e sigo assim no esforço de manter tudo do jeito que foi deixado. é certo que há o grito contido e ele haverá de vir, só não agora. é que há tudo a se dizer, mas não há ouvidos, então se fala a esmo, oferecendo a opção. é só que não cabe tudo aqui.

3 comentários:

Unknown disse...

"13 dias que no te vi
13 dias sin sentido
13 dias fuera de ti
13 dias para olvidar

13 dias que no te vi
13 dias me vuelvo loco" - 13 dias Manu Chao.
Março tem 31 dias.

Unknown disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Flávia S. disse...

porra, iasa.

 

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