22 março 2008

" Isabel me disse que escrevo como quem come. Todo dia, o mesmo cinza. "
cuidadosamente retirado do fotolog de priscilla menezes.

21 março 2008



dessa memória, que funcionou poucas vezes desde o último abandono - que foi o primeiro, que não houve tempo hábil para mais - e que foi assim: da primeira vez, desejei tão forte que nova iorque não estivesse lá, ao invés dela, o lago congelado onde me apresentaste a madrugada, e onde vi mais azuis que jamais vi em qualquer mundo, e onde o silêncio cortado pelo gelo grosso que rachava me dava um medo tão grande mas tão grande que eu engolia forte e os pelinhos arrepiavam e eu escondia, morta de vergonha, mas você absorto nem percebeu.


daquela outra, escrevi aquela carta que não era grande mas era funda, e que não pude mandar pra você porque ninguém conseguiu carregar, e olha que chamaram todos os carteiros da região, até das cidades vizinhas, mas era tão pesada, que o peso somou com o peso de todos eles juntos, e quando saíam da cidade caíram todos (os carteiros e a carta) naquela ponte que ficou bamba quando você passou com o jipe no caminho do trabalho, lembra.


aí teve a outra vez, que foi a última mas que doeu menos porque um dia a gente esquece como é mesmo que se dói, mas enfim, foi porque eu passei na frente de um café e tinha uma moça, toda de branco, tinha uma flor no cabelo, tão bonita. lia alguma coisa, parecia um convite, e ela tinha um olhar vazio e um respiro pesado e eu não sei o que tinha no convite mas o cabelo solto fazia uma escuridão embaixo do pescoço, e eu lembrei do meu cabelo e da minha escuridão e de como ela encaixava bem com o teu queixo, assim, quase que um quebra cabeças, e aí pensei que às vezes o quebra cabeça vem assim, de defeitinho, e a peça finge que encaixa mas não era bem aquela, olha, a cor é diferente um pouco, então lembrei que tinha que dar água pras plantas e colocar gasolina no carro, e esqueci da moça, do cabelo e de você. ficou só a escuridão.
 

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