21 julho 2007


o que fazia Marina tão doce ninguém sabia dizer, mas ela era como um quindim de domingo: leve, viva e maciça. Tais argumentos não a deixavam nunca, nem ao menos quando o vento a desfazia dos cabelos e da sanidade. André dizia, enquanto Marina não estava, que tudo [a amplitude do tempo nos dias de outono] se resumia à fugacidade das coisas. André era assim - falava profundo - e Marina poucas vezes o viu de perto, mas pra ela não importava, não o amava, nunca dele precisou. André a precisava - não só dela, André ventava tanto, e nem sempre a fugacidade o acompanhava. Eu conhecia André no íntimo, ou o conheci uma vez, mas então ele descobriu um amor novo em outro estado, ou algo assim, e deixou-se sumir por um tempo. Voltou para ver Marina.

Eu ouvia André e fingia acreditar nas sentenças que dizia, embora não compreendesse metade delas. Marina ainda estava distante quando Matheus acendeu um cigarro - não fumava desde 82 - e sentou no banco, descrente e pensativo. Expulsava indignação ao realizar que não se pode saber o que está por vir. "O inesperado mora no pensamento solto".

Marina demorava; passaram-se três mil anos até que chegasse. Antes disso, fiquei calada, atenta a tudo, ansiosa pela chegada de Marina, doce Marina. Estávamos quietos. Leandro não sossegava com a jaqueta, tirava e punha, ignorando o vento, a chuva e a neve. Só não aceitou um cigarro por profundas raízes ideológicas presentes em qualquer uma de suas palavras, sempre. Marina o tinha descoberto em uma noite calma e desde então passaram a ser amigos, embora saíssem faíscas toda vez que discordavam de opinião. Para Leandro, era um sinal de eternidade. Eu olhava pra Leandro com a mesma ansiedade com que esperava Marina.

Só Renan não se abalou: conversava comigo sem expectativas, as quais, se existissem, eu não respoderia, ele não poderia jamais esperar que eu prestasse atenção em tantas palavras soltas. Renan era amargo, mas apreciava o silêncio e o amor. Marina era pra ele como um rio de águas calmas, e por esse rio Renan caminhava sem escorregar.

Quando Marina chegou, só Renan manteve os olhos.

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