25 setembro 2008


lembro de uma época, deve fazer uns quatro ou cinco anos. eu já tinha tatuagens. eu costumava visitar uma amiga num apartamento que ficava na esquina da lamenha lins com a visconde de guarapuava. o sobrenome dela é francês. ela queria ser advogada.

acendíamos marlboros vermelhos e abríamos garrafas de vinho ou de vodka e ficávamos assim, penduradas na janela, com nossas saias e nossos grampos de cabelo. discutíamos poesia - todas, as que líamos, as que nunca tínhamos lido, as que nós mesmas nos arriscamos a escrever. falávamos do rock n' roll e de florbela espanca. entendi meus primeiros baudelaires naquelas noites. bebíamos sem saber direito por quê, mas nos completávamos assim. quando achávamos que o apartamento já ficava pequeno em relação ao mundo, saíamos.

uma vez, vimos a rua 24 horas amanhecer. ela passou a noite toda batendo boca com um porco capitalista. eu tomei muitas taças de vinho - era inverno e a rua 24 horas vivia como nós. se não me engano, foi na mesma noite do show cover do led zeppelin ou dos doors. hoje, não é difícil compreender por quê tantas noites em claro me despertaram os olhos para um mundo outro que não este.

feirinhas do largo da ordem, noites em claro com palavras que não controlávamos - às vezes, nem entendíamos. estávamos no mesmo transe que permitia nosso pulsar. numa dessas noites, dei-lhe um beijo.

ontem um recado dela quase passou batido por mim. há tanto tempo que o mundo não é mais claro como aquelas noites - embora as saudades sejam tão compridas quanto. as vidas mudaram e o transe não é mais o mesmo, mas a herança do marlboro adocicado pelo vinho me traz de novo à florbela e a talayer. algum sopro daquelas noites passa ainda por aqui - então eu lembro de um tempo em que a lamenha lins era tão doce quanto ela.

1 comentários:

madá disse...

'memory is a good thing if you don't have to deal with the past.'

lembranças doces, ruas vividas, vida boa. quando a gente era feliz e não sabia. porque, é claro, se a gente sabe que é feliz, a felicidade é sempre incompleta. humanos imperfeitos e sempre querendo mais.

todo dia é um dia novo, não?
eu sei que, no fundo, você tem uma caixinha de lápis de cor aí e sabe muito bem quando usá-la.

em hellcife, 48º e amor no coração.
ieeei \o/

 

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