23 março 2007


Não faça assim, querida. Tu sabes o que te acontece. És movida pelos problemas, e só eles te impulsionam. Cada pessoa têm seu próprio cordão pra quando precisar se agarrar: teu cordão é grosso, é barbante ruim. Daqueles que não rasga, que não corta, que fica preto, sujo, pegajoso, mas ali, resistente: não te deixa. Teu cordão é um fio grosso tecido por problemas, problemas mil, que te fizeram derrubar mais lágrimas do que o que sobrou de água potável nesse mundo. E sabes o que é pior de tudo isso? Gostas dos teus problemas. Gostas que eles existam, és incompleta e vazia sem eles. São teus amigos, teus escudeiros, teus moldadores, te mostram as direções - embora sejam tantas, as direções, e erradas, quase sempre. Mesmo errada, não desistes. E chora, e levanta, e lava a tua roupa, esfrega o teu fogão, e senta no chão frio da cozinha pra chorar um pouco mais, batendo de leve a cabeça na parede, mas ainda assim continua a esfregar aquela manchinha que não sai desse azulejo, meu deus, nem com reza braba. Dorme, quando consegues: quando não, conta pregas no assoalho e fica invertendo frases, brincando de palavras, como quem decora um texto que será apresentado em muito pouco tempo e mesmo com toda a dedicação do mundo, jamais conseguirá lembrar das palavras certas quando for a hora. E é assim, tu e teus problemas. Que te preencherão quando não tiveres mais ninguém; que te afastaram daqueles que tu já teve próximo. É tua sina, vá aquietar-se e se conformar. Que eles existirão sempre. Se não pra ti, dentro de ti.

9 comentários:

carla cursino disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
carla cursino disse...

Ah, Iasa...Esse texto parece ter sido escrito para mim. Eu e meu mundinho cheio de problemas...Mas, sim, são eles que me impulsionam, que me dão forças. É quase uma contradição; as coisas supostamente ruins nos fortalecem. A vida é mesmo irônica.
Beijo!

Ana disse...

Hoje a minha professora de filosofia estava me falando algo sobre isso.. Por que a minha amiga disse "ah, professora.. quem faz filosofia deve encontrar muitas respostas, digo, pra si mesmo né? a senhora deve ser uma pessoa super bem resolvida!". E bem, ela disse que não era, e que jamais gostaria de ser. Disse que temos que ter problemas mesmo, porque eles nos movem. E ela disse também que as pessoas bem resolvidas são infelizes, por não terem mais o que fazer. Os problemas são o amargo da vida, mas sem o amargo não teria o doce, o salgado e os demais sabores. Eles existirão sempre, os problemas. Mas também existirá, sempre e sempre, a opção de não pensar neles por alguns instantes.

Engraçado ela ter dito isso e você escrever sobre a mesma coisa.. Se cuida! Beijo.

Flavia S. disse...

Iasa, não me fode a vida :(

Moimechego disse...

Sei que vai soar repetitivo, mas não tem outro jeito: seus textos são de uma maturidade e de uma densidade assombrosas. Você escreve bem demais, tem talento, tem estilo, e seus textos têm beleza. Sim, beleza, essa palavrinha tão fora de moda, que provoca risadinhas mal abafadas de escarninho nos cínicos e caretas de ojeriza nos frívolos. E falo de Beleza de verdade, maiúscula, meio masoquista, que dói um poquitim mas é dor que alegra, como no samba de Candeia:

"E se houver tristeza que seja bonita, na paz do Senhor
Pois tristeza feia o poeta não gosta, na paz do Senhor"

Naiady disse...

O triste destino da.. mulher.

Drico Moraes disse...

"Ela gostava das lágrimas dele, e estendia seus belos dedos fazendo-as rolar por eles. Sua voz era tão baixa que no começo ele não conseguia entender o que ela dizia. Enão, ele entendeu. Ela disse que pensava que poderia sarar se as crianças acreditassem em fadas."
James M. Barrie, Peter Pan

P.S. não parei não só tinha esquecido a senha do blog :)

Anônimo disse...

bonito, muuuuito bonito!
iasinha...

madá disse...

eu te vejo sumir por aí.


eu vou ao show de chico.
e é claro que essa música remete você, sempre!

 

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